O diálogo essencial no sistema de saúde pública

No dia 10 de outubro, ocorreu no Centro de Debates em Políticas Públicas (CDPP), em São Paulo, um debate promovido pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e pela UMANE com o intuito de discutir as relações público-privadas no sistema de saúde. Líderes de associações do setor privado, do setor público, da academia e das instituições organizadoras estiveram presentes.

O debate foi conduzido com base na pesquisa “Setor Privado e Relações Público-Privadas da Saúde no Brasil: Em Busca do Seguro Perdido”, desenvolvida pelo IEPS em parceria com a UMANE, que analisa o crescimento e sustentabilidade do setor privado de saúde no país, assim como as ramificações de seu desenvolvimento no acesso à saúde da população brasileira.

Uma das conclusões-chave foi a urgência de uma regulação eficaz por parte do setor público das relações entre público e privado no sistema de saúde. A falta de regulação tem alimentado uma competição pelo acesso a recursos e pacientes entre os setores público e privado, levando a uma mercantilização excessiva do mercado de saúde. Isso dificulta a implementação de um sistema mais eficiente, resultando em desperdício de recursos e prejudicando o acesso da população aos serviços de saúde. Houve consenso sobre a importância de iniciar um diálogo entre as lideranças dos setores público e privado, liderado pelo Ministério da Saúde, a fim de fortalecer a regulação do sistema e abordar os desafios das relações público-privadas na saúde.

O objetivo desse diálogo é garantir o efetivo direito à saúde para a população, reunindo diferentes perspectivas para alcançar esse fim comum. Reconhece-se que nenhuma parte isolada conseguirá impor todas as suas propostas para o sistema de saúde no Congresso Nacional. É fundamental identificar convergências possíveis, tendo como base os princípios constitucionais.

A Constituição estabelece a saúde como direito de todos e dever do Estado, criando um sistema único, público e universal de saúde. Portanto, não se trata de dois sistemas separados, mas sim de uma complementaridade entre os setores público e privado, regulada pelo primeiro para atender às demandas da população.

Essa ambiguidade constitucional surge do compromisso político necessário para garantir a saúde como direito da população e estabelecer o SUS. No entanto, ao longo do tempo, a falta de regulação eficaz por parte do setor público comprometeu a cooperação entre os participantes do SUS. É essencial restabelecer e fortalecer esse acordo para garantir o efetivo acesso à saúde para os brasileiros.

A coexistência entre os setores público e privado representa um importante desafio político não resolvido desde a Constituição. Definir o papel do setor privado na prestação de serviços de saúde, respeitando os princípios constitucionais, não é trivial, considerando que os direitos à saúde não podem ser pagos individualmente.

Repensar o crescimento desenfreado do gasto privado, que atualmente representa 60% do total em saúde, enquanto o público é de 40%, é fundamental. Isso contradiz os padrões internacionais, onde o gasto público representa a maior parte. É crucial debater como enquadrar o setor privado na Constituição e garantir que seus interesses se alinhem com o bem-estar dos usuários do SUS.

O argumento de que um aumento no setor privado alivia a pressão sobre o setor público é falacioso. Isso apenas reforça a competição em vez da cooperação entre os setores, destacando o interesse comercial em vez do acesso universal à saúde. É essencial compreender que o setor público atende integralmente a população, enquanto o setor privado atende apenas parte dela.

O atual sistema de saúde enfrenta desafios decorrentes dos incentivos que favorecem o crescimento desenfreado do setor privado, gerando pressão sobre o SUS. Essa abordagem fragmenta o sistema, prejudicando os usuários e violando princípios como a coordenação do cuidado e a escala de serviços do SUS.

É imperativo compreender a interdependência dos setores estatal, filantrópico e privado para avançar na melhoria do sistema de saúde. O debate deve explorar questões como o poder de compra do setor público, a infraestrutura do setor privado e o financiamento tributário para promover uma regulação eficaz e um entendimento político renovado para superar os desafios de acesso, qualidade e financiamento da saúde no Brasil.